O resultado do Sistema de Seleção Unificado (Sisu) 2020, divulgado na noite deste terça-feira (28), trouxe alegria para muitos estudantes aprovados em diversas instituições de ensino públicas de todo o país.
No caso de Liliany Alves, de 21 anos, o resultado representou uma vitória que vai muito além de uma simples aprovação.
A jovem passou para o curso de Medicina da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), em Mossoró. Mas, para que isso fosse possível, Liliany teve que se esforçar e continuar estudando, sozinha, durante um duro tratamento contra um câncer.
Em entrevista ao MOSSORÓ HOJE, disse que sempre sonhou em ser médica. Ela concluiu os estudos em 2014, mas não conseguiu a aprovação no ano de conclusão e nem no ano seguinte, em 2015.
Em 2016, ela decidiu que ia se esforçar mais e estudar com dedicação para o Enem. Contudo, no mesmo ano, Liliany viu seu sonho ser adiado ao ser diagnosticada com Leucemia Linfóide Aguda.
Liliany contou que em 2016 percebeu um caroço crescendo na parte inferior do queixo. Após passar por diversos profissionais e ouvir de todos que se tratava de “algum tipo de infecção que causou uma íngua”, ela chegou ao consultório do cirurgião Thiago Demétrio, que desconfiou do contínuo crescimento do “caroço” e solicitou exames mais aprofundados.
O diagnóstico veio após fazer um exame Imuno-histoquímico. Ela então foi encaminhada para o oncologista André Aleixo que a acompanhou durante todo o tratamento.
Liliany explicou que descobriu a doença duas semanas antes do Enem 2016 e imediatamente começou o tratamento.
“Foi um baque muito grande, porque eu senti um ano todinho de estudo sendo perdido naquele momento. Faltavam 15 dias para o Enem, eu tava fazendo quimioterapia, não estava mais podendo estudar há um bom tempo devido a cirurgia e muitos exames e tudo isso atrapalhou minha rotina”, explicou.
Ela ainda chegou a fazer a prova, mas devido ao tempo perdido com consultas e exames, não conseguiu obter nota suficiente para aprovação.
“Nesse ano foi um chute na trave. Minha nota foi boa, mas não foi o suficiente. Eu fiz a prova já no processo de quimioterapia, com os cabelos já pingando em cima da prova. Inclusive foi engraçado, porque a prova foi no domingo e na segunda meu cabelo terminou de cair completamente. Eu pensei: tava só esperando eu ir fazer a prova com cabelo na cabeça”, brincou Liliany.
Os dois anos seguintes (2017 e 2018) foram extremamente difíceis, com muitas sessões de quimioterapia, que acabaram com a imunidade dela e a tiraram do convívio social, não permitindo, inclusive, que ela pudesse frequentar uma sala de aula para estudar para o exame.
Apesar de confessar que em muitos momentos se sentiu desmotivada por tudo que estava acontecendo e mesmo se sentindo muito cansada, Liliany nunca desistiu de lutar pelo sonho e passou a estudar, sozinha, no hospital, durante as sessões de quimioterapia.
Ela disse que no início ficava triste porque sabia que mesmo estudando no hospital, não teria como ter o mesmo ritmo e manter as notas. Por outro lado, estar naquele ambiente deu a ela uma motivação ainda maior diante de tudo que estava vendo e a fez não desistir de tentar.
“Eu pensava: meu Deus, eu quero fazer isso um dia, eu não posso desistir de tentar. Eu quero estar no lugar do meu médico um dia, eu quero um dia poder amparar uma menina igual a mim e dizer pra ela que eu tive o que você tá tendo hoje, mas eu tô aqui”, contou, afirmando que já escolheu a especialidade médica e que será a oncologia.
No ano passado, em 2019, ela entrou em uma fase mais branda do tratamento e conseguiu autorização médica para frequentar um cursinho, que ela disse ter sido essencial no processo.
“Eu entrei no cursinho no começo de 2019, depois de pedir muito ao meu médico para me deixar voltar a estudar em sala de aula. Aí eu ia pro cursinho com o cabelo bem ralinho. No início, ia até de peruca”, disse.
Liliany disse ser extremamente grata a todos os professores por terem compreendido a situação dela e, por muitas vezes, vendo tantos gastos que a família dela teve com exames, terem concedido bolsas de estudo e descontos para que ela não parasse de frequentar as aulas.
“Eu prefiro não mencionar os nomes dos professores, porque foram tantos que eu tenho medo de ser injusta e deixar de mencionar um deles, mas sou extremamente grata a cada um deles”, explicou.
Em agosto de 2019, após quase três anos de luta contra a doença, ela finalmente recebeu o diagnóstico de que a leucemia estava em remissão e que ela estava curada.
Deste momento em diante, foram 3 meses para que ela pudesse se dedicar sem distrações para o Enem. O resultado de todo esse esforço veio nesta terça-feira, por volta das 18h40, quando ela viu o nome dela na lista de aprovados em medicina da UERN.
Grata por tudo que viveu, Liliany disse que o apoio da família, dos pais Mirian Bezerra de Morais Araujo e Damião Alves Bezerra de Araújo e do irmão Daniel Alves Bezerra foi fundamental.
Não menos importante, ela agradeceu ao noivo com quem ela começou a namorar aos 14 anos e que esteve ao lado dela, enfrentado a doença, durante todos esses anos.
A jovem e Matheus Emanuel Câmara noivaram em julho de 2019, um mês antes dela receber a notícia de que estava curada.
“Matheus é minha vida. Estava comigo no diagnóstico, em todas as reprovações e ele era sempre o primeiro a dizer ‘não desista! Você nasceu pra isso, não desista por causa dessa situação. Deus está com você, Ele vai te reerguer’. No meu aniversário do ano passado, no dia da minha última quimioterapia, a gente noivou. Ele foi indispensável, sem ele, tudo teria sido muito pior do que foi”, concluiu.