O Ministério Público Federal (MPF) recorreu de uma decisão que absolveu dois professores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) acusados de violar o regime de dedicação exclusiva da instituição e gerar prejuízo de R$ 456.840,13 aos cofres públicos.
De acordo com o a denúncia, os dois servidores receberam salário superior para se dedicar apenas à universidade, porém atendiam - como médicos – em clínicas privadas e em uma prefeitura da região metropolitana da capital.
Conforme o MPF, o Tribunal de Contas da União (TCU) já apontou que a UFRN é o caso mais grave, dentre as universidades e institutos federais, “em relação a servidores em situação irregular, por possuir outros empregos incompatíveis com o cargo ocupado.” Ainda assim, a sentença de primeira instância absolveu ambos, mesmo após a juíza admitir que, “de fato, houve descumprimento do regime de dedicação exclusiva por parte dos professores”.
A juíza da primeira instância considerou que em um dos casos, a atitude do servidor “não se enquadraria como ímproba”, se resumindo a mera “irregularidade administrativa”. Em relação ap outro, não haveria dolo, ou má-fé, em sua ação. Em decorrência disso, e de uma alegada prescrição, também foi negado o pedido de ressarcimento do prejuízo.
Recurso
O procurador da República Ronaldo Sérgio Chaves Fernandes recorreu da decisão considerando que ficou comprovado que ambos os professores tinham plena consciência da improbidade que cometiam, desde que assumiram seus cargos na universidade.
No regime de dedicação exclusiva (DE), de acordo com o Decreto 94.664/87, o servidor tem a obrigação de “prestar 40 horas semanais de trabalho em dois turnos diários completos e impedimento do exercício de outra atividade remunerada, pública ou privada”. Em contrapartida, esse profissional recebe salário maior que o oferecido a quem mantém mesma carga horária, porém sem dedicação exclusiva.
“Aquele que opta pelo regime de dedicação exclusiva sabe perfeitamente que está recebendo uma remuneração maior para não exercer outra atividade remunerada, pública ou privada, de modo que o seu dolo resta evidente quando burla esse comando, inclusive podendo rir e fazer troça daquele professor que optou pelo regime simples de 40h”, enfatiza o MPF.
Para o procurador, ao deixar de punir essas ilegalidades, a Justiça abre brecha para que todos os professores que optaram pelo regime de 40h venham a buscar esse regime, mesmo sem se dedicar exclusivamente à UFRN.
Fatos
Um dos professores exerceu, de março de 2000 até sua aposentadoria da universidade, em de abril de 2009, o cargo efetivo de médico pediatra da Prefeitura de Extremoz, ao mesmo tempo em que era docente do Departamento de Engenharia Elétrica da UFRN, com “dedicação exclusiva”.
Ele só veio a deixar o cargo de médico em 2011. “O próprio demandado, ao prestar depoimento em juízo, confirmou que exerceu o cargo de médico pediatra (…) e, indagado pelo juiz se tinha ciência sobre a ilegalidade de sua conduta, concordou que não seria legal.”
O outro professor é docente do Departamento de Pediatria da UFRN, submetido à jornada de dedicação exclusiva, desde maio de 1993 até os dias atuais, porém nunca deixou de realizar consultas em clínicas. Foi constatado seu vínculo com clínicas, instituto e um plano de saúde. O próprio médico confirmou o fato à Justiça. “Ao contrário do entendimento exposto na sentença (...), o dolo na conduta do referido demandado também resta inquestionavelmente demonstrado nos autos”, entende o MPF.
O procurador lembra que, se desejassem exercer atividade remunerada fora da instituição, eles poderiam simplesmente abrir mão do regime de DE e optar pelo cargo de 20 ou 40 horas semanais. “Chegou a hora de pôr um basta nessa prática costumeira e nefasta”, destaca.
Ressarcimento
O MPF também alegou falha na sentença de primeira instância, que considerou ter havido uma suposta prescrição quanto ao ressarcimento dos danos. “O Plenário do Supremo Tribunal Federal (…) firmou a tese de que são imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário, fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa.” O mesmo entendimento foi consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça.
O recurso do MPF deverá ser encaminhado à apreciação do Tribunal Regional Federal da 5ª Região.