20 ABR 2024 | ATUALIZADO 22:33
POLÍTICA
Da redação
27/10/2018 15:37
Atualizado
22/04/2019 15:37

[OPINIÃO] Essa eleição é o diagnóstico do adoecimento psicológico do Brasil

"Pela primeira vez, em 32 anos de exercício do direito de voto, um candidato me inspira medo. Por isso votarei em Fernando Haddad", escreveu o ex-ministro presidente do STF Joaquim Barbosa
Por Mirela Ciarlini

Hoje ao ler a declaração do ex-ministro do Supremo Joaquim Barbosa (veja ao lado dir.), publiquei que o pensamento e o sentimento manifestados pelo mesmo me representam. Mas qual a profundidade, na minha ótica, da publicação? Ele disse no seu Twitter: “Votar é uma escolha racional. Eu, por exemplo, sopesei os aspectos positivos e negativos dos dois candidatos que restam na disputa. Pela primeira vez, em 32 anos de exercício do direito de voto, um candidato me inspira medo. Por isso votarei em Fernando Haddad". 

Mas vejam. Porque o ex-ministro cita a razão e justifica o seu voto pela emoção? Isso faz sentido? Fim faz. Existe o medo racional e o irracional e em época de tanto domínio pelas emoções de parte a parte, talvez seja útil entender um pouco. O medo é uma emoção natural e saudável que tem função de preservação. Isso quer dizer que quando você está com um medo saudável, você é capaz de pensar, de ponderar, o funcionamento do seu cérebro permite isso. Mas em níveis de medo muito altos como o que geralmente podem dominar as pessoas nas mais diversas situações de adoecimento psíquico, isso não é possível. 

Então você pode ter um medo saudável ou um adoecido. É possível você buscar reconhecer o  o seu pelas suas próprias atitudes, ações reativas, reações adoecidas. Parar de olhar e julgar ou tentar convencer aos outros e olhar um instante para você. Afinal você está se sentindo verdadeiramente bem e em paz com tudo que tem feito? A dificuldade é que quando as pessoas estão nesse nível de pavor, perdem a capacidade de raciocinar.

E isso é um mecanismo de proteção do próprio cérebro. Faz parte do nosso instinto de sobrevivência. Então Quando estamos tomados por um medo muito grande, uma estrutura cerebral, chamada amígdala “suga” toda a energia do neocortex (área do cérebro onde atuam nossas capacidades de raciocínio) e passamos a ser dominados apenas por instintos. Isto é. Não conseguimos pensar. Apenas domados pela parte mais primitiva do nosso cérebro reagimos como animais irracionais. 

O mais problemático é que a maioria das pessoas não tem consciência do estado de medo em que se encontram. Como afirma Daniel Goleman em sua obra Inteligência Emocional, emoções inconscientes provocam reações inconscientes. O próprio Freud já afirmava. Grande parte da vida emocional é inconsciente. “Os sentimentos que cruzam dentro de nós nem sempre cruzam o limiar da consciência (Goleman2012).

Isso quer dizer que esses milhares de brasileiros que estão brigando, se atacando, agindo reativamente, podem não ter nem noção do que elas mesmas pensam ou do que as move. Estão muitas vezes projetando sua própria sombra no outro como podemos acompanhar nos ensinamentos da Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung. Mas para entender tudo isso é preciso querer sair da superfície de dor na qual nos encontramos e mergulhar na profundidade do autoconhecimento em nós mesmos.

Como vimos o Ex-ministro não ofendeu ninguém, não está tentando impor sua verdade, falou apenas de sua decisão e seu sentimento e do que o move em tal direção. Uma fala sensata e racional baseada em suas emoções e pensamentos. Não falou ele dos aspectos positivos ou negativos tentando denegrir ou favorecer A nem B, apenas disse que colocou na balança as duas escolhas que restaram para a nação. Nem sequer disse ele que essas eram as escolhas de suas preferências ou não.

O que acontece então? Milhares de pessoas que não entendem ou aceitam seu posicionamento foram tomadas pela FÚRIA e então passam a atacar ao ministro por exercer seu direito de livre expressão.  É racional ou irracional não sermos capazes de respeitar a posição de outra pessoa? Seja ela quem for. 

Eu não publiquei a frase por ser de autoria do Joaquim Barbosa. Coloquei nas redes sociais porque espelhei meu pensamento e sentimento nela. Me identifiquei e achei de profunda sabedoria com o momento vivido no Brasil. Medo. Sim tenho medo de uma das opções. Sim pela primeira vez na vida um candidato me inspira medo e isso é parte da minha constituição psicológica pessoal.

Da minha própria habilidade racional e claro, também irracional. Não preciso ser militante de alguém ou ser a favor de algo errado para ter o direito de optar com paz entre as duas únicas escolhas que restaram. Afinal foi o país quem colocou as duas opções para votarmos. 

Para ilustrar melhor o que estou dizendo e que qualquer pessoa pode buscar estudar e se apropriar se estiver em busca de um processo pessoal mais profundo, quero citar uma pesquisa que recebi. Era uma imagem que recebi para tentar contradizer minha postura e minha escolha através da razão e da emoção medo. Era uma arte mostrando uma pesquisa que aponta o Brasil como o segundo país no mundo com maior medo de andar na rua a noite. Atrás apenas do Afeganistão. Bem. Afeganistão.

Como vocês acham que reage ao medo a população do Afeganistão? Com paz ou com guerra? O que vocês acham que esse nível de medo é capaz de fazer com a psicologia das pessoas? Eles conseguem pensar e sair fácil da condição em que se encontram? 

Olhar uma pesquisa que mostre que o brasileiro se considera o segundo país do mundo com mais medo de sair à noite e que de alguma forma nos coloca no padrão de pavor no Afeganistão só me faz chegar a uma pergunta. Estamos tão reativos, revoltados e cheios de dor como um país em guerra há décadas? A que tipo de consciência esse nível de medo leva? Vocês acham que no Afeganistão as pessoas se assustam quando alguém impunha uma metralhadora? Ou quando alguém diz que vai matar aqueles que os ameaçam? Vocês acham que lá a população deseja acesso a armamento? Acham que o país e as pessoas podem estar tomados por um desejo de vingança? 

E aqui no Brasil. Com um medo tão grande estamos tendo capacidade de raciocinar? De usar a razão como disse ter feito o ex-ministro? Ou estamos talvez em uma nação reativa, movida por instintos primitivos e sem a menor condição de ampliar sua própria consciência? Talvez se olhássemos através da ótica do pânico que está tomando nosso povo, ficasse mais fácil compreender o que está acontecendo com o Brasil.

O fato é que de um lado ou de outro onde atua desequilíbrio atua inconsciência e infelizmente não vencerá o candidato melhor ou o menos pior. Vencerá aquele que representa o medo mais doente e inconsciente. A eleição é o diagnóstico do adoecimento psicológico do Brasil.

Mirella Ciarlini
Jornalista com especialização em Psicologia Transpessoal, Psicopedagogia, Terapia em Constelação Familiar, Análise de Sonhos, Análise Comportamental, Coordenadora de grupos terapêuticos de autoconhecimento e Psicóloga em formação.

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