A produtora cultural Katharina Gurgel aproveitou para compartilhar nas redes sociais o caso de dois irmãos que ela observou guiando uma carroça pelas ruas de Mossoró. "Estava voltando da UERN hoje bem cedo, onde havia deixado a minha filha mais velha, quando vi dois meninos guiando uma carroça bem cheia. Eu parei, na saída da Universidade, para que eles passassem com o seu veículo", disse.
Os meninos disseram que utilizam a carroça para recolher comida e plásticos de condomínios de luxo da cidade. A comida vai para os porcos e o plástico é vendido para a reciclagem. Os porcos são vendidos e assim vão sobrevivendo.
Katharina disse que a situação a sensibilizou, o que a levou a reagir. "Mais na frente me lembrei que a minha filha mais nova havia separado umas roupas dela que não cabiam mais em uma sacola e que esta sacola estava no carro, justamente para situações assim, inesperadas e de encontros felizes", contou
E disse ainda: "Dei uma buzinada e acenei, para que eles entendessem que encostassem a carroça, que tinha algo para dá-los. Encostaram, encostei também, liguei o pisca alerta e desci do carro para ir ao encontro dos dois"
Segundo a produtora, os irmãos eram "lindos, de cabelos loiros e os rostos bem delicados. Um tinha os olhos bem claros, o mais novo. O outro, mais velho, segurando a rédea, com a cara de desconfiado para mim (não arredio, apenas com a cara de quem queria saber o que uma mulher estava querendo com eles naquela hora da manhã)". ]
Logo em seguida, ela teve uma conversa com os meninos. Veja o relato:
- Oi, tudo bem?
- Tudo bom.
- Vocês são irmãos?
- Somos.
- E essa carroça tão pesada, homem, não ta ruim de guiar não?
- Não, a gente já é acostumado demais!
- É o que que tem aí nesses sacos pesados na carroça?
- Resto de comida e coisas plásticas que esse prédio aí separa pra gente. Falou apontando para um condomínio de luxo que tem bem em frente aonde havíamos parado.
- E vocês fazem o que com esse material?
- É assim, a gente cria porcos lá onde a gente mora, ali no Santo Antônio, aí a gente separa a comida para os porcos e os plásticos a gente vende. Os porcos da gente são bem gordinhos. Quando a gente vende eles, tira um dinheirinho bom danado.
- Entendi. Mas vocês estudam?
- Estuda sim, a gente estuda de tarde, e nunca falta não, viu? Vem com a carroça pegar essas coisas só essa hora de manhazinha mesmo.
- Ah, que bom! Vocês têm irmã?
- Temos. A gente é três homens e duas mulheres.
- Eu estou com umas roupas de menina aqui no carro e queria saber se vocês aceitariam.
- A gente quer sim senhora.
Fui ao carro, peguei a sacola de roupa e uma nota de vinte reais. Entreguei a sacola para o mais novo e a nota para o mais velho.
- Como vocês se chamam?
- Meu nome e João Paulo, respondeu o mais velho.
- E o seu? Perguntei ao mais novo, que era também mais calado.
- João Paulo.
- João Paulo também? Vocês dois se chamam João Paulo?
- É, os dois. Foi pai e mãe que quis botar assim.
Sorri para eles, achando curioso e ao mesmo tempo bonito, por que aparentava que eles tinham orgulho de ter o mesmo nome.
- Olhe, aqui tem vinte reais, veja o que vocês acham melhor fazer com o dinheiro, ta?
- Dona, obrigada! A gente vai dividir dez pra mim, e dez pra ele. A gente vai guardar pra usar depois, né João Paulo? Falou o mais velho, olhando para o mais novo, que agora sorria olhando para a nota.
Desejei boa sorte aos Joões Paulos, voltei para o carro e eles seguiram pelo caminho para o destino deles.
Sei não, a cada dia que ouço, vejo e vivencio histórias de pessoas grandiosas, travestidas de seres humanos normais, como esses dois irmãos tão novos e tão fortes, eu agradeço a Deus a possibilidade de aprender com eles mais sobre educação, humildade, força, fé e gratidão.