O município de Coronel João Pessoa, de mais ou menos cinco mil habitantes, se transforma, neste período do ano, na capital da rapadura, mel e alfinim no Oeste do Rio Grande do Norte.
E não é qualquer derivado da cana de açúcar que os moradores da região dominam a técnica de produção há décadas. Trata-se de cana de açúcar orgânica e o processamento é artesanal.
A informação é do secretário Municipal de Agricultura, João Bosco, que acompanhou a reportagem do MH.
João Bosco explicou que a produção da cana de cana de açúcar, diferentemente de outros tipos de cultivos, não se começa no início do inverno e sim no final do período chuvoso.
Ele falou que os sucos cavados no solo argiloso recebem os troncos de cana para reprodução e logo em seguida água, que existe em abundância e de ótima qualidade no Vale de Coronel João Pessoa.
Não se pode plantar cana no início do inverno, por que a região alaga e impediriam o crescimento das mudas. Plantando no fim do inverno, regando, no início do inverno do ano seguinte, a canavial já está no tamanho que suporta receber uma carga de água maior.
Do plantar a colheita, que é feita de forma braçal por dezenas de trabalhadores, com o corte no facão, são 12 meses. Uma vez colhida, é colocada em tratores e levados ao engenho.
Existe vários engenhos em funcionamento no município, segundo a prefeita Fátima Alves, todos de forma artesanal e moendo cana produzida sem agrotóxico. A produção sem agrotóxico é uma política pública municipal abraçada pelos produtores, por entender que o produto terá valor agregado na comercialização.
A prefeita acompanhou a reportagem em visita ao engenheiro de Francisco Viana de Sousa. Os dois explicaram como funciona o processo de produção de rapadura, mel e alfinin artesanal.
Quando a cana é desembarcada na bagaceira que fica lado da casa do engenho, passa por um processo de retirada da palha e, em seguida, é colocada ao lado da moenda.
Chico Viana explicou que o trabalho na moagem começa de 2 horas da madruga. O Almoço da rapaziada é de 9 horas da manhã. É preparado no local pelas mulheres da comunidade.
No meio da tarde, tem outra refeição reforçada. A turma dorme cedo, para de 2 horas da madrugada do dia seguinte já está no batente, cortando, transportando e processando a cana.
O engenho mói a cana, produzindo o que eles chamam de garapa ou caldo de cana. É muito apreciado. O bagaço da cana moída é colocado para secar no pátio ao lado ao engenho.
O passo seguinte é usar o próprio bagaço da cana, já seco, para alimentar o fogo da fornalha, que aquece os tachos com o caldo da cana numa temperatura incrível.
Neste momento, entra em cena o primeiro especialista no processo artesanal da produção de rapadura, mel e alfinin: o mestre caldeireiro. Este operador ainda não é o mestre do engenho.
Ele ferve o caldo da cana até um ponto específico, que poucos conhecem, retira o que eles classificam como (tiborna), descarta ou destina para o consumo animal da região.
O mestre caldeireiro transfere o restante para segundo tacho, onde ele adiciona cal (faz o tempero) na quantidade certa. Depois o mel é transferido para o terceiro tacho.
Do terceiro, quarto e quinto tachos, o mel é apurado, fervido até atingir uma certa viscosidade. "Deste momento em diante, já está pronto para o consumo", explica Chico Viana.
O mel é vendido para comerciantes dos estados da Paraíba e também do Ceará. No Ceará, é conhecido pela qualidade e também por ser orgânico e produzido artesanalmente.
O mel que continua fervendo nos tachos é transferido para o tacho final (móvel), onde passa a receber atenção do mestre principal do engenho, Seu Gecir. É ele que dá o ponto final no momento exato.
Neste vídeo acima, o Mestre Gecir explica, inicialmente, que existe batida e existe rapadura. São duas coisas distintas. A batida é feita com o mel apurado um pouco antes do que é destinado para fazer a rapadura tradicional.
No momento que é transferido para gamelas de madeira para o preparo da rapadura, também é retirado um balde para fazer o alfinin.
Enquanto a rapadura tradicional é feita na gamela de madeira, o mestre do tacho (Seu Gecir) prepara a batida, com batidas fortes, e um grupo de mulheres, apoiadas por homens puxam o alfinin para ele endurecer. Quando ele já está quase endurecendo, eles fazem uma espécie de rosa e coloca numas vasilhas plásticas. Está pronto.
Além do engenho administrado por Chico Viana, a reportagem do MH esteve em outros, como o de Gilberto Rufino, que está entre as primeiras famílias a chegar a região com engenho. Devido ao acesso difícil, naquela época sem transporte, os moradores não sabem como trouxeram engenheiros fabricados na Europa para Coronel João Pessoa.
Ao MH, Gilberto Rufino mostra uma peça do antigo engenho de sua família e que agora virou peça de decoração no terreiro de casa e serve para contar a história da família ao longo das décadas.
Rufino fala com esperança de bons invernos e de grandes produção de cana de açúcar. Ele disse que se o inverno tiver uma sequencia boa, ele volta a criar gado.
A produção artesanal de rapadura, alfinin e mel, com cana de açúcar sem agrotóxico, para a prefeita Fátima Alves, vai bem além de uma tradição de décadas das famílias do município.
Para ela, é o que move a economia do município de Coronel João Pessoal, geograficamente localizado dentro de um vale, com solo rico e água em abundância.