O presidente Jair Bolsonaro trocou quatro dos sete integrantes da Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. A alteração foi publicada no “Diário Oficial da União” desta quinta-feira (1º), com a assinatura do presidente e da ministra Damares Alves, da pasta da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Questionado por jornalista sobre o motivo da mudança, Bolsonaro disse que a mudança ocorreu porque mudou o presidente da República.
"O motivo [é] que mudou o presidente, agora é o Jair Bolsonaro, de direita. Ponto final. Quando eles botavam terrorista lá, ninguém falava nada. Agora mudou o presidente. Igual mudou a questão ambiental também", afirmou
A alteração foi oficializada uma semana após a comissão emitir documento que atesta que a morte de Fernando Santa Cruz, pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, se deu de forma “não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro”.
Na segunda-feira (29), Bolsonaro afirmou que "um dia" contará ao juiz que preside a OAB como o pai dele desapareceu na ditadura militar. "Ele não vai querer ouvir a verdade. Eu conto para ele", disse.
Horas depois, o presidente afirmou, sem apresentar provas, que a morte foi causada pelo "grupo terrorista" Ação Popular do Rio de Janeiro, e não pelos militares.
Na quarta-feira, o presidente da OAB acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) para que Bolsonaro conte o que diz saber sobre o pai dele.
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Além do atestado de óbito emitido pela comissão que teve a composição alterada por Bolsonaro, relatório da Comissão Nacional da Verdade destaca que documentos da Marinha e da Aeronáutica apontam que Fernando Santa Cruz foi preso e desapareceu enquanto estava sob custódia das Forças Armadas, em 1974.
SUBSTITUTO É ASSESSOR DE DAMARES
O novo presidente da Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, Marco Vinicius Pereira de Carvalho, é filiado ao PSL, partido de Bolsonaro, e assessor especial de Damares. Ele foi funcionário da prefeitura de Taió (SC).
A presidente substituída do colegiado, primeira da lista de trocas, havia criticado Bolsonaro na segunda-feira pelas declarações relacionadas a Santa Cruz.
"Consideramos extremamente grave pela dor dos familiares, mas também pelo fato de ser um presidente da República de um país que vem assumindo essas mortes desde 1995, pelo menos", afirmou Eugênia Gonzaga.
Questionada sobre ter sido retirada da comissão, nesta quinta-feira, Eugênia disse que "já esperava".
"Eu ainda não tinha visto... Eu já esperava desde a caminhada do silêncio. Lamento muito também, mas ia acontecer mais cedo ou mais tarde”, declarou,
COMISSÃO CRIADA EM 1995
A Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos foi criada em 1995, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.
A lei nº 9.140 estabelece que o colegiado realizará o reconhecimento de desaparecidos por atividades políticas entre 1961 a 1979, período que engloba a ditadura militar (1964-1988) até o ano em que foi promulgada a Lei da Anistia.
A legislação também estabelece que os sete membros da comissão devem ser de livre escolha do presidente da República, sendo que quatro deles devem ser escolhidos:
dentre os membros da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados
dentre as pessoas com vínculo com os familiares das pessoas referidas em lista divulgada pelo governo federal em 1995
dentre os membros do Ministério Público Federal
dentre os integrantes do Ministério da Defesa (este item se referia, inicialmente, a integrantes das Forças Armadas, o que foi alterado em lei de 2004)