Era uma vez uma “uma gripezinha” que se transformou em um grande negócio. No meio do caminho, mais de 500 mil mortos, um País traumatizado, milhões de pessoas acossadas pelo desemprego e pela fome.
É um enredo tão radical que não foi cogitado sequer nos piores pesadelos dos democratas que alertaram a nação sobre os riscos de apostar em Bolsonaro.
Com o cinismo que lhe é peculiar, o rufião da morte que ocupa o Planalto encontrou uma maneira macabra de perverter a máxima segundo a qual uma crise é sempre sinônimo de oportunidade.
Desde que a Organização Mundial de Saúde reconheceu a pandemia de coronavírus, em março de 2020, estava claro que o Brasil precisaria de testagem em massa para detectar os contaminados, precisava de medidas de prevenção —distanciamento social, máscaras, campanhas informativas. Estava óbvio que o povo precisava de socorro contra o paradeiro econômico. Precisava de vacinas.
Bolsonaro riu de tudo isso. Pra gente como ele, cuidar de vidas não dá lucro.
Mas na abordagem descarada de uma crise sempre é possível encontrar uma oportunidade—ainda que se trate da maior crise vivida pelo País em sua história recente e que vidas brasileiras estejam em jogo.
Primeiro, foi a aposta na cloroquina, que encheu os bolsos de empresários farmacêuticos claramente identificados com o bolsonarismo. Só o laboratório Apsen — maior fabricante do medicamento e presidido por Renato Spallicci, apoiador de primeira hora de Bolsonaro — foi brindado com R$ 153 milhões em contratos assinados com o BNDES para pesquisas e ampliação da capacidade produtiva.
Enquanto isso, o Bolsonaro descartava as vacinas: ridicularizava a Coronavac, atrapalhava a produção da AstraZeneca, sabotava a aprovação da Sputnik e ignorava as ofertas da Pziser.
Pelo que sabemos agora, o que parecia ser fanatismo anitivax pode ter sido um episódio abjeto, calculado e homicida de “quem dá mais”: A oportunidade da compra de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin, negócio de R$ 1,6 bilhão, com preço superfaturado em 1000%. Uma vacina que tem a eficácia e a segurança questionadas e não contava, à época do contrato, com a aprovação da Anvisa.
Este novo enredo macabro foi confirmado ao Brasil na última sexta-feira (25). Ao longo de oito horas e 35 minutos (das 14:17h às 22:52h), a CPI da Covid do Senado ouviu o depoimento do deputado Luís Miranda (DEM-RJ) e de seu irmão Luís Ricardo Miranda, chefe de importação do Departamento de Logística em Saúde do Ministério da Saúde.
Eles confirmaram à CPI que havia fortes elementos de suspeita de corrupção no processo de compra da Covaxin, que ocorreram pressões poderosas para que fosse dado andamento ao negócio. E que, desde 20 de março deste ano, Bolsonaro sabia de tudo. Segundo eles, o presidente da República teria classificado a trama como “coisa de fulano” e que iria determinar uma investigação da Polícia Federal sobre o caso.
Após a pressão dos senadores da CPI, o País ficou sabendo que “fulano” é o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), prócer do Centrão, líder do governo Bolsonaro no Congresso, ex-ministro da Saúde de Temer e autor de uma emenda que teria facilitado a importação da Covaxin.
Quanto à investigação da Polícia Federal, não há registros de que ela tenha sido aberta, ainda que a lei brasileira exija que o ocupante de função pública denuncie qualquer irregularidade da qual tome conhecimento, para não incorrer em crime de prevaricação.
As investigações ainda estão longe de acabar. Quanto mais se desfia o novelo das ações de Bolsonaro frente à pandemia, mais indícios de crime aparecem. O Brasil exausto, porém, já não pode ter dúvidas: não é incompetência, não é fanatismo. Estamos sendo governados por um rufião da morte.
*É senador pelo PT/RN.