29 MAR 2024 | ATUALIZADO 18:35
ESTADO
Ivenio Hermes
21/08/2016 13:32
Atualizado
13/12/2018 06:44

Transparência e participação social versus agenda positiva

A excessiva divulgação de informações publicitárias de uma gestão não pode incutir na opinião pública resultados que não se sustentam.
A excessiva divulgação de informações publicitárias de uma gestão não pode incutir na opinião pública resultados que não se sustentam.
 

O ano 2014 terminou com a criação de um grande marco na história da transparência e da participação social na construção de informações sobre segurança pública, o registro e publicação do Pacto Interinstitucional para o Mapeamento de CVLI. O COEDHUCI - Conselho Estadual dos Direitos Humanos e da Cidadania e a SESED - Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social, na gestão do Secretário Eliéser Girão Monteiro Filho, e outras diversas entidades como o MPRN, FOSEG, Comissão de Segurança da OAB Mossoró, OAB/RN, e outros, resolveram fazer um esforço conjunto e criar sua própria definição de CVLI – Crimes Violentos Letais Intencionais para pôr um fim nas divergências entre as informações governamentais e as informações das pesquisas, que frequentemente divergiam e se digladiavam.

“As informações não pertencem mais exclusivamente ao governo do estado, é de todos, e se o governo as quiser esconder, diante deste processo de construção da transparência, não seria capaz. ” Declaração de Marcos Dionisio Medeiros Caldas – Presidente do COEDHUCI – Conselho Estadual dos Direitos Humanos e da Cidadania, dada à imprensa durante umas das reuniões da Câmara Técnica de Mapeamento de CVLI.

O ano de 2015 iniciou com a criação da Câmara Técnica de Mapeamento de CVLI, que por meio do OBVIO Observatório da Violência Letal Intencional no Rio Grande do Norte e usando a Metodologia Metadados, coletavam dados e construíam informações que eram apresentadas mensalmente pela Coordenadoria de Informações Estatísticas e Análises Criminais da SESED, após serem auditadas pela UFERSA, Defensoria Pública e Ministério Público. Era a celebração da transparência e de uma fase inédita no Rio Grande do Norte, em que a participação popular era tão aclamada que suscitou as brilhantes palavras de Marcos Dionisio Medeiros Caldas citadas acima.

Entretanto, todo governo que se baseia excessivamente na divulgação de informações publicitárias de sua gestão, tentando a todo custo incutir na opinião pública uma propaganda de seus feitos, mesmo quando eles não estão obtendo os resultados que se espera, é levado a criar uma agenda positiva, que se não controlada, vira um ser mítico que devora todas as críticas construtivas em nome da aparência de sucessos, de números estatísticos direcionados para a manutenção da imagem do governo.

“Na guerra, a verdade é a primeira vítima. ” Ésquilo

Essa agenda positiva exagerada, tomou proporções que não tardariam a se contrapor com a verdadeira transparência, com a divulgação real da realidade que acontece e com as críticas construtivas que apontam equívocos e maus direcionamentos apenas para transformá-los em ações concretas e que surtam resultados reais em suas políticas públicas. Mas quando se trata de segurança pública, que é uma força que está além das divulgações da agenda positiva e que pulsa como um ser vivo e se mostra no cotidiano das pessoas, nenhuma ação de publicidade se mantém sem resultados sensíveis.

Enquanto o Governo do Estado do Rio Grande do Norte se manteve atrelado aos conceitos técnicos, o sucesso das ações foi tão sensível que houve uma redução da criminalidade em geral, inclusive no ano 2015 superou a meta proposta pelo Plano Nacional de Redução de Homicídios da SENASP – Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça.

Destaque-se, nessa conquista, o uso das informações obtidas nas análises criminais de complexidade, que não se resumiam apenas a tabelas e gráficos estatísticos, mas traziam em seu bojo estudos e ponderações que congregavam ideias dos membros da Câmara Técnica de Mapeamento de CVLI e do OBVIO, todos apresentados em textos que mostravam que as lacunas nos planejamentos prospectivos, estratégicos e de complexidade, que iam sendo esquecidos à medida que conflitavam com a agenda positiva, e nesse ponto, a efetividade das ações de segurança pública, recai em primeiro lugar sobre as polícias, cujos profissionais agem mais sob a determinação de suas responsabilidades do que pautados por algum tipo de planejamento, e segundo lugar, sobre os profissionais de mídia, que precisam usar suas capacidades profissionais para manter a sociedade constantemente bombardeada de realeases e textos da agenda positiva das ações governamentais.

photo_2016-08-21_18-26-11O quadro acima apresenta dados extraídos do site da SESED, mostrando todas as matérias publicadas em todas as páginas disponíveis, contemplando o período entre maio de 2014 a agosto de 2016. Das 322 páginas disponíveis, 40 são da Administração Ciarlini, perfazendo um total de 71 publicações, e o restante (282 páginas) fica dividido entre o primeiro ano e o segundo ano da Administração Faria, sendo 160 páginas com 362 publicações em 2015 e 122 páginas com 348 publicações em 2016 até sexta-feira, 19 de agosto de 2016.

Para aferirmos de forma equilibrada a intensidade de publicações referentes à agenda positiva da segurança pública apenas, pois não fizemos nenhuma pesquisa nas páginas das outras secretarias do estado, segmentamos o período de interseção desses três anos, ou seja, os meses de maio a agosto (até o dia 19) conforme apresentamos no gráfico abaixo:

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Entre os meses evidenciados observamos que entre o último ano da Adm. Ciarlini e o primeiro ano da Adm. Faria, houve um crescimento médio de 153,7% no número de publicações, e entre o primeiro e o segundo ano da atual administração, há um crescimento médio de 107,1%. Das 400 publicações dos dois anos da atual administração, apenas 22 versavam sobre a transparência nas informações de segurança pública, todas apresentando índices de redução, nenhuma apresentando as críticas apontadas pela Câmara Técnica de CVLI nem sobre o equacionamento que se estaria dando à alavancada nos índices de CVLI – Condutas Violentas Letais Intencionais apontadas pelo OBVIO – Observatório da Violência Letal Intencional no Rio Grande do Norte. De fato, desde fevereiro a Câmara Técnica tem suas reuniões pouco divulgadas e desde junho suas reuniões canceladas.

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As informações acima são do OBVIO – Observatório da Violência Letal Intencional no Rio Grande do Norte, que participa socialmente da construção de informações estatísticas desde 2014, e que entre janeiro de 2015 e junho de 2016 participou ativamente da produção das estatísticas criminais do Governo do Estado, sendo excluído do processo desde julho de 2016, retornando as informações da criminalidade violenta letal intencional de volta ao poder quase exclusivo do Governo do Estado.

Somente temos as informações acima graças aos esforços do OBVIO e do COEDHUCI, que diante do silêncio atual da gestão, continuam a evidenciar esforços para manter os números acessíveis ao público, embora o OBVIO e o COEDHUCI venham sendo privados de acesso às informações governamentais desde que este escriba, deixou a Coordenadoria de Informações Estatísticas e Análises Criminais da SESED.

A evolução na transparência e na participação social na construção de informações sobre segurança pública parece ter perdido a importância, e diante dos números que apresentam o ano de 2016 como possivelmente o ano mais violento da história do Rio Grande do Norte, sucumbe diante da importância superlativada que se têm dado às publicações da agenda positiva da segurança pública,

A realidade da segurança pública na Adm. Ciarlini era mitigada pelo silêncio nas ações governamentais, e na atual administração, é embotada pelo retorno à falta de transparência. E as palavras de Marcos Dionisio Medeiros Caldas, se perdem sem eco no silêncio do que aparenta ser o retorno à era da obscuridade nas informações sobre segurança pública no Rio Grande do Norte.

VOV

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Texto de Ivenio Hermes
Colaboração de Henrique Baltazar, Thadeu Brandão e Sáskia Hermes

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